Quem vê a alegria estampada no rosto de Valnéia da Silva Gutierrez, 72, não imagina a grande perda que ela carrega desde os 39 anos. À época, mãe de dois meninos, a aposentada aguardava com ansiedade a chegada da primeira filha, quando um exame de rotina detectou o bebê natimorto.
“Já estava com nove meses. Foi a maior surpresa, pois estava tudo bem. Fiquei muito abalada e o médico pediu que eu fizesse uma ultrassonografia. Quando recebi o resultado, foi confirmado o óbito da criança. Naquele momento, fui encaminhada imediatamente para a maternidade”, relatou.
Além do apoio de familiares e amigos na cesariana de emergência, a aposentada contou com a solidariedade de doadores de sangue que, literalmente, devolveram-lhe a vida. “Uns 20 minutos depois da cirurgia, tive uma hemorragia muito intensa, quando eu precisei urgente de sangue. Meu irmão, que era da Polícia Militar, chamou colegas que doavam sangue e conseguiu umas bolsas, e isso graças a Deus salvou a minha vida”.
Essa história de morte e renascimento é um exemplo de como o ato de doar sangue é vital, seja ajudando pessoas com doenças hematológicas variadas e câncer, como as que se submetem a cirurgias eletivas de grande e médio porte e nos casos das emergências médicas.
Para homenagear e agradecer aos doadores de sangue, como os policiais que salvaram a vida de Valnéia, e sensibilizar a população quanto à importância da doação, nesta sexta-feira, 25 de novembro, comemora-se o Dia Nacional do Doador de Sangue, data criada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2004.
Com a proximidade das férias, festejos de fim de ano e o carnaval, o mês de novembro antecede um período crítico nos bancos de sangue, como explicou Liliana Bezerra, enfermeira do único centro de captação e transporte de sangue e hemocomponentes de Roraima, o Hemoraima.
“Natal e Ano-Novo é nosso período mais crítico. E agora com a Copa, se não houver campanhas nossos estoques podem praticamente zerar”, alertou.
Pauta legislativa
Promover o debate e ações alusivas, assim como conferir benefícios e incentivos aos doadores, é o que a Assembleia Legislativa de Roraima (ALE-RR) tem feito desde a década de 1990 para aumentar os estoques de sangue do Estado.
“Temos aprovado várias matérias estimulando a doação de sangue, pois é importante fomentar essas políticas públicas no Poder Legislativo. Faço um convite a quem tem boa saúde a procurar o Hemocentro, e reforço que aquele que doa também pode ter vários benefícios aprovados neste Parlamento, como a isenção de taxa de concursos públicos, entre outros”, afirmou o presidente da ALE-RR, Soldado Sampaio (Republicanos).
Do ex-deputado estadual Célio Rodrigues Wanderley, o Parlamento aprovou a Lei nº169/1997, que determina aos doadores cadastrados em programas da Setrabes (Secretaria Estadual do Trabalho e Bem-Estar Social) a concessão mensal de uma cesta básica, vinte vales-transportes e uma passagem em transporte intermunicipal, de ida e volta, no trecho capital-residência do doador, exames ambulatoriais e hospitalares com prioridade no atendimento.
A Lei nº 273/2000, da ex-deputada Suzete Mota, institui no âmbito da Sesau (Secretaria de Estado da Saúde) ações de fiscalização e controle da qualidade do sangue utilizado no sistema estadual.
Já a campanha nacional “Junho Vermelho” faz parte do Calendário Oficial de Eventos do Estado desde 2019, por meio da Lei nº 1.361/19, da deputada Yonny Pedroso (PL). Há ainda o “Dia Estadual do Doador de Sangue”, em 14 de junho, conforme preconiza a Lei nº 1.014/15, dos ex-deputados Jalser Renier e Naldo da Loteria.
O estímulo à doação de sangue entre os jovens é o mote da Lei nº 1548/2021, de Neto Loureiro (MDB), que cria e concede o selo gratuito “Sangue Amigo” às instituições de ensino superior que organizam campanhas de doação anual ou semestralmente, em parceria com o Hemoraima. Ao aderir ao ato solidário, o estudante tem falta abonada no dia.
Benefícios financeiros e trabalhistas também foram pautados. É o caso da Lei nº 167/1997, da ex-deputada Zenilda Maria Portella, que regulamentou a isenção do pagamento de inscrição em concursos públicos estaduais aos doadores.
Outro benefício é o pagamento de meia-entrada em todos os locais públicos de cultura, esporte e lazer, como teatros, museus e cinemas, estabelecido pela Lei nº 1.325 de 2019, do deputado Neto Loureiro (PMB) e do ex-deputado Jalser Renier (SD).
Assim como o abono de falta no trabalho no dia da doação sem desconto na folha de pagamento uma vez a cada 12 meses, conforme artigo 473 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Já a Lei nº Lei nº 1571/2021, da deputada Tayla Peres (Republicanos), determina a fixação de cartazes nos estabelecimentos comerciais que ofereçam serviços de tatuagem, piercing ou maquiagem definitiva, informando o impedimento de doação de sangue por determinado período (de 6 a 12 meses), conforme estabelece a Portaria do Ministério da Saúde nº 158/2016.
Os avisos também devem ficar visíveis ao público nos postos de saúde, hospitais, bancos de sangue, centros de hemoterapia e outros estabelecimentos assemelhados da rede pública ou privada.
Ampliação
Acompanhando de perto os avanços nas políticas públicas que garantem a oferta de sangue e hemoderivados, Liliana Bezerra reconhece os avanços, mas salienta que a legislação ainda precisa contemplar vários estratos sociais.
“Existe uma lei que passou na Assembleia, a do Selo Amigo, que é destinado às universidades. Hoje, a gente tem grupos no Exército, no Corpo de Bombeiros que doam. Tivemos recentemente uma doação em massa do Iper [Instituto de Previdência de Roraima]. Então, que possamos estender esse selo para empresas. Aqui nós não temos como fazer nenhum incentivo, já se esse selo parceiro fosse estendido, isso de certa forma faria com que o empreendimento detentor passasse a ser visto como diferente. Outra sugestão é facilitar a vinda do doador ao instituir um benefício no transporte. Tudo isso seriam leis muito bem-vindas”, destacou a enfermeira.
Os centros de captação de sangue possuem três tipos de doadores. Os de reposição ajudam as pessoas que se submetem a cirurgias, ou seja, repõem o sangue do paciente durante procedimentos médicos. Em média, se reservam três bolsas de sangue para uma cirurgia de grande porte. Os doadores de campanha, geralmente, são atraídos por ações alusivas pontuais promovidas pelos centros e/ou de empresas e órgãos públicos. Já os voluntários são os cadastrados nos centros de hemocomponentes.
Apesar das opções, o número de doares quase sempre está abaixo do ideal. “Se um dos doadores de reposição não vier, nós já teremos uma baixa. Com o voluntário, é a mesma coisa quando não mantém a frequência de doação. Muitos deles só vêm uma vez. Se fôssemos contar o número de pessoas registradas, nem faltava sangue. Mas não podemos parar de buscar doadores, pois a todo momento temos uma nova demanda”, esclareceu Bezerra.
Uma das cadastradas do Hemoraima, a aposentada Iramita Peixoto, 60 anos, foi ao centro doar. Porém, confessa que engrossava o número dos voluntários inativos. “Faz mais de quatro anos que vi uma campanha e senti vontade de doar. Depois, não vim mais. Agora, voltei por causa de uma amiga que está precisando”, confessou.
Em breve, é Iramita quem precisará de doação por causa de uma cirurgia. Ela confessa que a necessidade do ente querido e a própria tem sido o seu maior incentivo para se tornar doadora regular e abraçar de vez a causa.
“Estou aguardando eles marcarem minha cirurgia e aí sou eu que vou precisar correr atrás de três doadores. Eu mesma sou saudável e posso doar todo ano e não doava, mas a partir de agora pretendo fazer isso sempre. Então, vamos incentivar todos a doar, tantas pessoas precisam e a gente não tá nem aí”, ponderou.
Veja os critérios para doação de sangue:
- ter entre 16 e 69 anos (menores de 18 precisam da presença do pai ou da mãe ou responsável legal);
- pesar mais de 50 quilos;
- grávidas e diabéticas não podem doar sangue;
- estar alimentado. Evitar alimentos gordurosos nas quatro horas que antecedem a doação de sangue;
- caso seja após o almoço, aguardar duas horas;
- ter dormido pelo menos seis horas nas últimas 24 horas;
- pessoas com idade entre 60 e 69 anos só poderão doar sangue se já o tiverem feito antes dos 60 anos;
- a frequência máxima é de quatro doações de sangue anuais para o homem e de três para as mulheres;
- o intervalo mínimo entre uma doação de sangue e outra é de dois meses para os homens e de três meses para as mulheres.
O Hemoraima coleta sangue de segunda a sexta, das 7h30 às 12h e das 13h30 às 18h, na Avenida Brigadeiro Eduardo Gomes, 3418, bairro Aeroporto, Boa Vista. Também é possível tirar dúvidas por meio do telefone (95) 98404-9593.
Texto: Suellen Gurgel
Fotos: Marley Lima/ Nonato Sousa
SupCom ALE-RR
Fonte: ALE-RR | Assembleia Legislativa de Roraima – Leia mais